quinta-feira, 31 de julho de 2008

Perspectivas de gênero, feminismo e condições das mulheres

No contexto das discussões preparatórias para a realização da Conferência Caio Prado Jr., convocada pelo Partido Popular Socialista, é fundamental a consideração de algumas reflexões sobre perspectiva de gênero, feminismo e condição das mulheres visando o aprofundamento e o enriquecimento dos debates.

O feminismo trouxe uma contribuição essencial à política ao colocar que “o pessoal é político” e que a luta pela democracia desenvolve-se “na rua e em casa”, ou seja, na esfera pública e privada. Com esta visão, este movimento político e cultural alertou para a conexão entre estas duas esferas da existência e para o fato de que as práticas democráticas e de dominação que nelas circulam se reforçam mutuamente. Assim, propôs o resgate das relações interpessoais - relações sociais e de poder tanto quanto as relações de trabalho e as relações políticas institucionalizadas – promovendo a sua politização, publicização e reconstrução enquanto objeto de políticas públicas e de construção da cidadania.

As mulheres têm exercido a condição de “sujeito político” em projetos coletivos, prioritariamente de cunho privado (familiar). No espaço público, as mulheres participam ativamente de associações e movimentos na sociedade civil organizada, mas estão pouco presentes nos partidos políticos e têm uma representação muito reduzida nos espaços de poder no âmbito do Estado (Executivo, Legislativo e Judiciário), ocupando em torno de 10% destas posições. Considerando que as mulheres, enquanto segmento social e político, têm sido discriminadas, marginalizadas e excluídas dos processos e contextos da política representativa, pode-se afirmar que a crise da política, dos políticos e dos partidos têm sido, basicamente, uma crise que envolve os homens, seu cotidiano e suas práticas.

Os movimentos feministas e de mulheres vêm colocando que a saída para esta crise implica necessáriamente o alargamento da compreensão da ação política para todas as esferas da existência; implica a abertura para o engajamento dos segmentos subrepresentados na política institucionalizada, como as mulheres, a população negra e os jovens; implica a transformação dos partidos políticos em instituições que possam considerar o cotidiano de sujeitos concretos – mulheres, homens; crianças e adolescentes, adultos e pessoas idosas; pessoas de diversas raças e etnias; com diversas expressões de sexualidade; pessoas em condições físicas e mentais diferenciadas; com diferentes formações, ocupações e rendas; com diferentes culturas e visões de mundo; enfim, com diferentes histórias, projetos, interesses e gostos. Para além de considerar os sujeitos concretos, em sua pluralidade, os partidos precisam transformar-se em espaços de enriquecimento humano, pela afirmação de valores caros à humanidade, pelo acolhimento de afetividades, pelo estímulo a idéias e práticas críticas e de cooperação, rumo à construção de espaços e relações democráticas, igualitárias, humanas e fraternas.

A afirmação de uma esquerda moderna e democrática exige a formação e o desenvolvimento de seres humanos maduros que possam estabelecer relações pautadas pela ética, pela criatividade e reciprocidade, pelo respeito às diferenças. Exige o enfrentamento constante de práticas perversas, narcísicas, de retaliação e de aniquilamento do “Outro”. Exige a distinção fundamental entre espaço público e espaço privado, o respeito à coisa pública, à coisa de todas/todos, e o enfrentamento e a superação dos fenômenos de privatização e de partidarização do Estado, de suas políticas, de suas instâncias e recursos.

A construção de um projeto democrático e de desenvolvimento para todas/todos exige a incorporação de uma perspectiva de gênero, ou seja, a visão de que as intervenções públicas precisam levar em conta a história e o cotidiano diferenciado de mulheres e de homens. Nessa medida, é indispensável a adoção e o desenvolvimento de uma perspectiva de gênero nas políticas e nos orçamentos públicos visando desencadear mudanças nas exclusões, desigualdades e discriminações de gênero, fenômenos estruturantes da desigualdade social no Brasil e no mundo. De igual forma, é fundamental a incorporação de uma perspectiva ambientalista e de sustentabilidade, que possa orientar as intervenções humanas, no público e no privado, no sentido do desenvolvimento com preservação e defesa de um planeta mais humano, generoso e acolhedor para as presentes e futuras gerações.

Brasília, 20 de março de 2007.
Almira Rodrigues
p/ Executiva da Coordenação Nacional de Mulheres do PPS

Identidade e relações de gênero (1)

Quando nasce uma criança, diz-se que ela é homem ou mulher, a partir do que apresenta em termos de genitália externa. Mas o ser mulher, bem como o ser homem, só começa com o reconhecimento de si mesmo ou a formação da identidade pessoal, passo inicial da estruturação da personalidade. A identidade de uma pessoa constrói-se após o nascimento, num processo simbiótico com as figuras parentais, em interação com o meio, até expressar-se como individualidade em atitudes e sentimentos sobre o eu. Um importante componente do processo de construção da identidade é a identidade sexual.

Para Money, Tucker (1981), pioneiros nesta área, identidade sexual é o senso de si mesmo como homem ou como mulher; é a experiência pessoal ou privada do papel sexual. A identidade consiste no quanto a pessoa diz ou faz para indicar aos demais ou a si mesma, o quanto se é homem, mulher ou ambivalente. Assim, o papel sexual é a expressão pública da identidade, ou o conjunto de condutas esperadas associadas à sexualidade e socialmente exigidas do indivíduo, de acordo com o seu gênero. A identidade sexual é, dessa forma, configurada mais adequadamente como identidade de gênero devido à diferença entre os conceitos de sexo e gênero.

Sexo pode ser definido como uma conformação particular que distingue o macho da fêmea nos animais e nos vegetais, como os órgãos sexuais externos e até como sinônimo de relação sexual. Entretanto o gênero implica na construção social e histórica do ser mulher e do ser homem.

Tomando por base Scott (1991), definimos gênero como um elemento constitutivo das relações baseadas nas diferenças que distinguem os sexos, ou nas diferenças percebidas entre os sexos. Dessa forma, o conceito de gênero encontra-se imbricado nos conceitos de identidade sexual, de papel sexual e no de relações entre os sexos.

Dada a natureza social do conceito de gênero, a identidade e o papel sexual estão afinados aos estereótipos culturais dos sexos, fundamentados nas diferenças genitais feminina e masculina que as transcendem. Entretanto, entre estes dois modelos ou pólos, há uma infinidade de conjugações de níveis e intensidade de pessoas, que extrapolam os espaços definidos pela sociedade para serem ocupados pelos homens e pelas mulheres.No que diz respeito à linguagem, o gênero é percebido como efeito da dominação simbólica, não expressa na lógica consciente, mas de modo subjacente, nas práticas e categorias dicotômicas para homens e mulheres: seco-úmido, duro-macio, claro-obscuro, aparente-recôndito, alto-baixo, acima-embaixo. Estas categorias se sustentam mutuamente e, embora concordantes, são suficientemente divergentes para conferir valores a cada uma delas.

Cada vez que um dominado emprega para se julgar uma das categorias constitutivas da taxonomia dominante (por exemplo: brilhante/esforçado, distinto/vulgar, único/comum etc.) ele aplica a si mesmo, sem o saber, o ponto de vista dominante, adotando, de algum modo, para se avaliar, a lógica do preconceito desfavorável. (Bourdieu, 1995, p. 142-143)

Nesta ótica, a mulher introjeta a condição feminina impregnada de sentidos de oposição na inferioridade e que envolvem a negação do masculino como sendo feminino, enquanto que o homem introjeta o masculino como sinônimo de superioridade e poder.

O gênero pode ser definido também como o modo contemporâneo de organizar normas passadas e futuras, um modo dos indivíduos se situarem na sociedade como homens ou como mulheres, e, através dessas normas, um estilo ativo de viver o corpo com uma noção rígida de que o corpo do homem é incisivamente diferente do corpo da mulher. A rígida separação de gêneros representa uma ofuscação ideológica daquilo que partilhamos. Dividir-nos contra é limitar potenciais da expressão humana. (Cornell e Thurschwell, 1990, p. 171)

As organizações binárias, principalmente as baseadas em polaridades de gênero, são efetuadas por uma forma de poder produtiva e estratégica; a subversão desta polaridade não se dá, necessariamente, pela sua superação, mas pelo reconhecimento de múltiplas formas de ser entre os pólos. Assim, construindo a diferença entre homens e mulheres e entre o feminino e o masculino, a história de meninos e meninas seguem caminhos diferentes que se cruzam, determinados pelo meio e pela cultura, que apresenta peculiaridades que variam no tempo e no espaço.

Desde os primórdios de nossa cultura, a menina aprende, na família, que ser mulher é saber cuidar de crianças, cozinhar, lavar, passar, cuidar da casa e do marido; ser mulher é adotar a postura do servir, do submeter-se, do obedecer ao pai, irmão, marido, etc.; é ser dependente, passiva, dócil, carinhosa, gentil, paciente, emotiva; é ser aquela que sabe agradar, e mais uma série interminável de 'atributos' tidos como femininos. O menino, por outro lado, aprende que ser homem é ter sob seu comando as experiências dos outros, especialmente das mulheres, é poder tomar decisões por todo um grupamento social como a família, é ser ativo, viril, corajoso, intransigente etc.

Na escola, as primeiras concepções acerca do papel da mulher apreendidas no âmbito familiar, são freqüentemente reforçadas enquanto se processa a aquisição de outros comportamentos e atitudes, resultando na incorporação, pela menina, da concepção do ser mulher, traduzida como ser boa aluna, educada, obediente, sentimental, frágil, aplicada, entretanto, menos pragmática, facilmente conduzida por regras e normas e, por isso, mais afeita às ciências humanas, às letras e às artes. Nos meninos são encorajadas a liderança, a criatividade, a praticidade e a ousadia, qualidades, dentre outras, requeridas para profissões 'ditas' masculinas como dirigente de empresas, construtores, pesquisadores etc.

Também a mídia, agente formador de opinião cada vez mais importante na atualidade, contribui de modo significativo para a criação e/ou manutenção de estereótipos sexuais. Programas e seriados de TV, peças comerciais veiculadas por revistas, jornais, rádio e televisão, além de filmes, reafirmam, intencional e subliminarrmente, a dicotomia dos papéis sexuais, reservando a homens e mulheres imagens tradicionalmente construídas. Soma-se ao papel dos meios de comunicação, a relevância dos relacionamentos sociais para os jovens, que tendem a seguir o modelo vigente no grupo e a opinião de seus amigos, via de regra, diferenciado para meninas e meninos.

Através de generalizações forçadas, em que a verdade vai sendo alterada, diferenças vão sendo estabelecidas entre homens e mulheres, tornando seres humanos essencialmente iguais, em diferentes. (Passos, 1999, p. 94)

Pelos processos de imitação e de identificação, as meninas vão introjetando sentidos e significados e exercitando um fazer estabelecido pela sociedade como eminentemente feminino, que se desenvolve, prevalentemente, na esfera de vida familiar, no âmbito do privado ou pré-político (Arendt, 1995).

Impedidas, historicamente de 'ver o mundo', de exercer o poder no domínio público, as meninas crescem sob diversas inluências que culminam com a atribuição de um alto valor à profissões tidas como mais adequadas à condição feminina, que envolvem o exercício do cuidar, do ensinar e do servir. Dessa forma, na maioria das vezes, o poder que as mães têm com os filhos, enquanto crianças, e com os alunos - para a mulher- mãe e professora - pode se constituir numa forma de exercer o poder que em outras circunstâncias lhes é subraído ou negado. Essa construção se dá, evidentemente, a partir das concepções de gênero internalizadas por homens e por mulheres.

Essas concepções e pontos de vista levantados no âmbito da análise sobre identidade de gênero exigem a consideração de abordagens historicamente consagradas sobre a questão. Dentre elas temos a abordagem culturalista, que acreditamos, fornecer indicadores concretos para a compreensão do processo de construção do ser homem e do ser mulher.

Abordagem culturalista

A abordagem culturalista parte do pressuposto que viver em sociedade é característica da espécie humana. Devido às suas carências e necessidades, os seres humanos foram compelidos a viverem juntos, vez que sua manutenção e sobrevivência dependiam da convivência e das relações sociais.

Registros históricos nos sugerem que houve um tempo em que a ordem social foi fluida e permissiva: as mães e outras mulheres da família cuidavam das crianças e a vida foi nômade e sedentária, a depender da escassez de alimentos e outras condições, o que provocava migração para diferentes regiões. Parece, também, ter havido rodízio de poder entre os indivíduos de um grupo e dos grupos entre si. Nesse contexto, houve uma divisão social de trabalho a princípio arbitrária, mas o fato das mulheres ficarem grávidas, alimentarem e protegerem os filhos, conduziu-lhes a alimentar e cuidar de todo o grupo, enquanto os homens exerciam atividades para a provisão de alimentos, como a caça e a pesca, para todo o grupo e principalmente para si. (Engels, 1982)

Badinter (1986), analisando as relações entre os sexos, retoma algumas lendas que narram sobre a existência de tribos só de homens e só de mulheres, autônomas, cujos membros só se encontravam fortuitamente para se entregarem a folguedos amorosos. As crianças de ambos os sexos, originadas desses encontros, ficavam, no início, só com as mães e, mais tarde, os meninos passavam para a tribo masculina. Para ela, circunstâncias adversas devem ter acontecido nas tribos femininas que as levaram a se unir à dos homens, ficando, em conseqüência, sob sua guarda.

Outras lendas apontam para o mito da separação inicial - a mulher num espaço circunscrito, dedicando-se à colheita e ao cuidado dos filhos e os homens, num espaço mais vasto, dedicando-se à caça, assegurando o provimento de todos.

O fato de que a manutenção individual fosse a tarefa do homem e a sobrevivência da espécie fosse a tarefa da mulher era tido como óbvio; e ambas estas funções naturais, o labor do homem no suprimento de alimentos e o labor da mulher no parto, eram sujeitas à mesma premência de vida. (Arendt, 1995, p. 40)

Essas reflexões conduzem à suposição de haver existido, em todas as sociedades e em todas as épocas, uma divisão sexual de trabalho com distinção valorativa das funções desempenhadas por homens e mulheres, fruto das relações entre eles, das relações sociais entre os gêneros. No âmago dessas relações, o masculino aparece como superior, independente, de grande significado e o feminino como inferior, dependente, de pouco significado; à mulher cabendo o lugar de subalterna, de quem historicamente não se construiu como sujeito, de quem pouco exerceu o poder, podendo apenas acumulá-lo e reproduzi-lo.

Tais colocações remetem-nos ao Patriarcado, que se refere ao estado social no qual o pai, chefe da família, exerce sobre esta os direitos mais absolutos. Patriarcado diz respeito ao poder universal do homem sobre a mulher e sobre seus filhos. Universal no que tange à dominação do homem sobre o núcleo familiar e porque aparece em diversas culturas e épocas. O termo Patriarcado abrange, também, toda estrutura social que nasce de um poder do pai, o poder tradicional, o poder procriador, o poder absoluto. (Badinter, 1986)

O Patriarcado Clássico ou Tradicional, incorpora ao domínio paterno todas as relações de poder. A argumentação patriarcal é construída a partir de uma teoria do direito e de obediência política; consiste em associar o poder político ao paternal, originado na submissão dos filhos ao pai, que sucedeu o domínio do homem sobre a mulher. Ou seja, assim como a mulher estava sob o domínio do homem, os filhos dele nascidos, a ele estavam também submetidos. A abordagem do Patriarcado inscreve-se fortemente no mundo social, especialmente nas relações de dominação e exploração das mulheres pelos homens.

Buscando explicar esse estado de submissão das mulheres, nada natural, Pateman (1983) analisa a diferença entre liberdade e sujeição como uma diferença política, que tem raízes no 'contrato social' ou pacto original. Para ela, esse contrato:...é sexual no sentido patriarcal - isto é, o contrato cria o direito político dos homens sobre as mulheres - e também sexual, no sentido do estabelecimento de um acesso sistemático dos homens aos corpos das mulheres (...) ele é o meio pelo qual se constitui o patriarcado moderno. (ibid, p. 17)

Segundo esta autora, o Patriarcado Moderno se dá em termos de fraternidade, de contrato e estrutura a sociedade civil capitalista. Neste sentido, fraternidade e política relacionam-se intimamente, vez que fraternidade abrange os homens como pessoas, não só como habitantes de determinadas cidades ou polis.

Enquanto o patriarcado tradicional utiliza a família como metáfora da ordem política, entendendo todas as relações de superioridade e subordinação como semelhantes à relação pai-filho (ibid, p. 127), o patriarcado fraternal moderno baseia-se na teoria do contrato social. O Patriarcado Moderno crê na abrangência maior do poder político instituído sobre bases diferentes e atribuído a fins diferentes do poder paterno; incorpora a noção de exploração por parte de quem exerce o poder, ou seja, o domínio do outro se dá através da sua exploração.

Também no final do século passado, os escritos de Marx e Engels (1970) vieram a se constituir em subsídios para se admitir que a identidade feminina e os papéis desempenhados pelas mulheres tem suas raízes na relação entre estrutura econômica e sociedade. Ao tratarem da história humana, Marx e Engels consideraram que o desenvolvimento da humanidade teve sua origem no trabalho, compreendido como processo de transformação da realidade objetiva pelo homem e de transformação de si próprio ou autocriação. Para eles, em razão do incremento da produtividade, do aumento das necessidades e do crescimento populacional, ocorreu, então, a formação da consciência gregária ou tribal e em decorrência, a divisão do trabalho, divisão essa estabelecida em função das diferenças de gênero e idades no interior dos grupos sociais. A primeira divisão do trabalho se fez entre o homem e a mulher na criação dos filhos. Posteriormente, com o aperfeiçoamento das forças produtivas e o surgimento de excedentes de produção, a divisão do trabalho tornou-se mais complexa: uma parte da população passou a administrar o processo produtivo, do qual progressivamente se apoderou do produto (e deteve o poder), e a outra parte ficou com o papel de reproduzir (e em conseqüência, ser submissa, uma vez que reproduzir, socialmente, vinha em segundo plano em relação ao produzir, prover). Diante disso, depreende-se que a propriedade privada foi decorrente da divisão e da alienação do trabalho. Uma releitura das posições de Marx e Engels permite concluir que os homens passaram à situação de donos do poder e as mulheres, de excluídas e submissas, embora se considere que a relação entre dominantes e dominados não é simétrica.

Como a divisão do trabalho aparece sob variadas formas na sociedade, o modo de produção do homem e da mulher numa mesma classe social e qualquer que seja a classe, nem sempre é o mesmo. Sob esse prisma, Saffioti (1976, p.301) coloca-nos dois pontos básicos para reflexão: primeiro que, passada a fase de acumulação originária do capital, as oportunidades de trabalho para as mulheres passaram a ser reguladas de modo diverso, deixando de refletir a dinâmica própria de cada fase de desenvolvimento da formação social-capitalista. O segundo ponto (...) é que, com o desenvolvimento gigantesco da tecnologia, e, conseqüentemente, com a crescente elevação da produtividade do trabalho humano, a sociedade de classes dispensa, para a criação de sua riqueza, o concurso de todos os seus membros adultos normais.

Obviamente, neste contexto, a história tem revelado que quando o mundo do trabalho precisa reduzir seu quadro de trabalhadores, a dispensa do trabalho feminino é consideravelmente maior e mais freqüente que o masculino. Este dado reforça o direcionamento da personalidade feminina para valores mais ligados à vida familiar, e o da personalidade masculina para a competição pelo mercado de trabalho e ajustes necessários aos diversos papéis que se espera, o homem deva desempenhar. Mas a mulher insistindo em penetrar e permanecer no mundo do trabalho, na vida pública, rompe barreiras: fá-lo, entretanto, sob o signo da inferioridade que o sexo feminino representa em relação ao masculino. É ocupando as posições inferiores, recebendo salários menos compensadores, não aspirando aos postos de mando que a mulher ´resolve´ ou alivia as tensões que a inconsistência de seus papéis origina. (Saffioti,1976, p.307/308)

Dentre os postos ocupados nessas circunstâncias está o de educadora, de professora ou outros, vinculados, primordialmente, a instituições de ensino, e todos das áreas do cuidar e do servir. As tarefas dos serviços sociais constituem-se também prolongamentos dos trabalhos domésticos.

Souza-Lobo (1991) constatou que grande parte das ocupações femininas nas indústrias parecem requerer tarefas repetitivas que exigem atenção e paciência, destreza e minúcia, resistência à monotonia, qualidades socialmente definidas como próprias da força de trabalho feminino. Sua análise depreende, também, que a feminização de setores e tarefas são parte de uma estratégia de barateamento dos custos da força de trabalho.

Para ela, as mulheres menos conscientes de seus direitos como trabalhadoras, menos participantes e politizadas, aceitariam trabalhos mais baixos... (ibid. p. 147)

À essa postura, bem responde o materialismo histórico dialético ao postular que, além das condições materiais de vida interferirem no pensamento das pessoas, também o pensamento e as idéias interferem no fazer feminino e no seu estar no mundo.

Do ponto de vista filosófico, outra dualidade se manifesta intervindo na construção das identidades: o predomínio da razão ou da emoção na compreensão e interpretação do mundo bem como da inserção de homens e mulheres neste mundo. A construção dessas idéias remonta à época medieval que tinha na dúvida o eixo fundamental de compreensão das coisas, em oposição à razão. A Modernidade inverte esta relação quando passa a ter a razão como eixo a determinar o que é aceitável ou não, o que é certo e o que é errado, o que é mais e o que é menos importante. Neste contexto, a emoção passa a se situar em um plano de menor importância. Desse modo, o critério da razão definirá a quem cabe o domínio da sociedade, quem é capaz de pensar o mundo e dirigir o destino das pessoas. Assim, a sociedade estimula os homens a serem racionais, a se controlarem, a sufocarem e matarem o seu lado emocional, tido como seu lado frágil. O que se espera dos homens é que eles falem do que produzem, uma vez que a masculinidade assenta-se na virilidade e na profissão. Ele tem que ser o provedor, aquele que assegura a vida e o destino da família. As mulheres, contrariamente, são colocadas como emotivas e por isso frágeis e dependentes, primeiro do pai, depois do marido e também dos filhos. Ter nascido do sexo feminino é ter incorporado a pureza, o ser mãe e o maternar, o ser companheira, o não exercício do poder, o ser dependente. Num processo entre as relações sociais e o que foi internalizado durante o seu desenvolvimento como pessoa, a mulher constrói uma identidade até o ponto em que acredita ser todos esses valores pertinentes à sua condição feminina. Essas construções não podem ser vistas como iguais, lineares, absolutas, porque não há uma única e absoluta categoria de mulher, o que seria por demais excludente. Em cada época e em cada sociedade os gêneros se modificam, são mutáveis.

Para as teóricas feministas que partem da existência de um domínio patriarcal, a raiz da condição feminina mostra-se na relação social de desigualdade entre os gêneros, historicamente construída e em vigência até os dias de hoje, onde o homem detém o poder sobre a mulher, sobre o filho, sobre a propriedade e no Estado - domínio público - enquanto a mulher restringe-se à condição de submissão, de dominação, do mundo privado, entendendo-se aqui o ensinar como pertinente à esfera privada, como 'extensão do lar'. Na perspectiva culturalista é possível vislumbrar que os constructos relacionados ao ser mulher surgem em oposição ao significado do ser homem, numa sociedade com esquemas de relacionamentos sociais bem definidos. Assim, a menina se percebe mulher enquanto semelhante à mãe, reproduzindo o modo como ela se coloca diante do pai, no seio da família; em instâncias mais abrangentes como a escola e outros grupos sociais, apreende que ao ser feminino 'destinam-se' certas funções como cuidar, servir e educar, em campos restritos pouco (ou não) reivindicados pelos homens.

Neste contexto, são introjetadas nas meninas e nos meninos, desde muito cedo, em diversos âmbitos de suas personalidades e do seu ser social, as dicotomias associadas à divisão homem-mulher, tais como: caça-coleta, dominação-submissão, luz-sombra, ciência-magia, razão-intuição, cultura-natureza, força-fragilidade, para fora - para dentro, superioridade-inferioridade, produção-reprodução, mundo público-mundo privado, de forma a tornar aparentemente natural, a identidade que, às mulheres e aos homens foi socialmente imposta.

Referências Bibliográficas
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BADINTER, E. Um é o outro. Relações entre homens e mulheres. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.

BOURDIEU, P. A dominação masculina. Educação e Realidade, Porto Alegre, 20 (2), p. 133-184, jul./dez. 1995.

CORNELL, Drucilla, THURSCHWELL, Adam. Feminismo, negatividade, intersubjetividade. In : BENHABIB, Sheyla. CORNELL, Drucilla (Orgs.). Feminismo como crítica da modernidade. Rio de Janeiro : Rosa dos Tempos, 1990. p.155-174.

ENGELS, F. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. 8. ed. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 1982. 215 p.

MARX, K., ENGELS, F. Manuscritos econômicos e filosóficos. In : FROMM E. Conceito marxista do homem. Rio de Janeiro : Zahar, 1970.PASSOS, E.S. Palcos e Platéias - A s representações de gênero a Faculdade de Filosofia. Salvador : EDUFBa., 1999. Coleção Bahianas 4.

PATEMAN, C. O contrato sexual. Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1993.

SAFFIOTI, H. I. B. A mulher na sociedade de classes: mito e realidade. Petrópolis : Vozes, 1976.

SCOTT, J.W. Gênero: uma categoria útil para análise histórica. Recife : SOS Corpo, 1991.

SOUZA-LOBO, E. A classe operária tem dois sexos. Trabalho

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IDENTIDADE E RELAÇÕES DE GÊNERO

Cristina Pereira Carvalho Fagundes - fonte: Cadernos de Pesquisa do NUFIHE. Salvador: Programa de Pós-Graduação em Educação/UFBA. V.3, n. 1, p. 169-186, jan./dez,1991.

Formação política e perspectiva de gênero

O Estado brasileiro, desde meados dos anos 1980, elege como uma de suas metas promover a igualdade entre mulheres e homens, requisito essencial para a consolidação da democracia.

No mesmo rumo, cabe aos partidos políticos incorporar não só nos seus estatutos, mas também na sua prática cotidiana, a defesa e a implementação de medidas e ações que viabilizem a igualdade entre mulheres e homens.

É a partir do reconhecimento das desigualdades de gênero, que cresce a importância de debates e ações no âmbito partidário. Nesse sentido, os cursos de formação política se constituem em espaços apropriados e especiais para a reflexão sobre a igualdade de gênero e a cidadania das mulheres.

O conceito de gênero

A idéia de gênero se reporta ao feminino e ao masculino. A partir das diferenças biológicas, meninas e meninos são impelid@s a vivenciar determinadas formas de sentir, de pensar e de agir. São educad@s e moldad@s segundo o que a sociedade considera apropriado a cada um dos sexos. As diferenças acabam sendo transformadas em desigualdades, perpetuando assimetrias entre mulheres e homens e em suas relações.
Uma dessas diferenças é o fato de que as mulheres são socializadas para ocuparem, particularmente, o espaço privado, aquele onde se desenvolvem os cuidados, o doméstico, o subjetivo. A esfera pública como o lugar onde se exerce o direito, a liberdade e se decide sobre o destino de todos é ocupada, especialmente, pelos homens.

O questionamento de toda essa situação gerou o discurso feminista: por igualdade de direitos e de oportunidades, respeito às diferenças, democracia na rua e em casa, cidadania no público e no privado.

Afirma-se, assim, a necessidade de se discutir as relações sociais entre mulheres e homens, entre as mulheres e entre os homens, bem como as representações sociais sobre o feminino e o masculino. Nesse sentido, o conceito de gênero é utilizado como uma categoria de análise, que coloca o "ser mulher" ou "ser homem" como uma construção social, diferenciando-a do sexo biológico. Enquanto as diferenças biológicas entre os sexos são naturais, o gênero é construído e sujeito à mudanças, porque estabelecido por convenções sociais e varia em função da época e dos padrões culturais.
O conceito expresso por Joan Scott sintetiza o termo ao classificar gênero como “... um elemento constitutivo das relações sociais baseado nas diferenças percebidas entre os sexos... o gênero é uma forma primária de dar significado às relações de poder” (Gênero: Uma Categoria Útil de Análise Histórica, Educação e Realidade, 1995).

As organizações feministas e os movimentos de mulheres vêm utilizando em suas análises e práticas o conceito de gênero, que permite uma melhor compreensão de como os espaços público e privado e as esferas da produção e da reprodução são marcadas por esta dimensão de gênero.
Compreender como as relações de gênero estruturam o conjunto das relações sociais é fundamental para se pensar as práticas e relações cotidianas de mulheres e homens dentro de um grupo, de um partido, da sociedade, e considerar as suas histórias e singularidades.

Sujeito político – Igualdade de gênero

Quando se fala na igualdade entre mulheres e homens como projeto/utopia de humanidade, já é preciso pensar na linguagem como elemento de inclusão e de paridade. A linguagem é masculina. Ao se utilizar o masculino para designar também o feminino, a subjetividade fica diluída, difusa, e não se contempla a diversidade da condição humana.

O uso do sinal @ na escrita, para abranger o feminino e o masculino, tem sido uma forma de subverter essa escritura única. Esta guerrilha de linguagem foi introduzida por feministas e vem se expandindo para todas as regiões do mundo.

Lutar por uma linguagem inclusiva significa lutar também pela cidadania das mulheres. Neste processo de luta, as mulheres constroem noções para expressar suas dificuldades, opressões e projetos: dupla jornada, função social da maternidade, direito e escolha da maternidade, violência doméstica, assédio sexual, dupla moral sexual, direitos sexuais, direitos reprodutivos, empoderamento.

No Brasil, a força da mobilização e das organizações de mulheres conseguiram importantes avanços na Constituição de 1988. A função social da maternidade foi reconhecida; a licença paternidade foi criada; o planejamento familiar foi reconhecido como direito e livre decisão do casal; o Estado ficou responsável por coibir a violência no âmbito das relações familiares. Estes dispositivos, entre outros, expressam como determinadas questões antes consideradas da ordem do privado, passam a ser tratadas como questões públicas e, portanto, merecedoras de serem consideradas na formulação e implementação das políticas públicas.

Possibilidades e Desafios

O PPS tem marcado presença na discussão e nas propostas sobre a igualdade de gênero e superação das discriminações contra as mulheres na sociedade brasileira. Textos, resoluções, propostas em sintonia com a luta dos movimentos de mulheres foram elaboradas pelo PCB e pelo PPS.
Atualmente, o Partido incorpora as reivindicações das mulheres, especialmente sobre participação política, em seus documentos internos. Mas é preciso ir além, propiciando o compartilhamento dos espaços de poder entre mulheres e homens.

Alguns partidos têm organizado e sustentado espaços que contribuem para a maior participação das mulheres na vida partidária, em decorrência da mobilização de suas militantes. Com isso, as mulheres são estimuladas e apoiadas no exercício da prática política.

No entanto, não é suficiente a criação de estruturas partidárias internas voltadas para as questões de gênero. É fundamental que a partir dessas estruturas, sejam garantidas as condições efetivas de trabalho partidário, tanto para a superação da sub-representação das mulheres na política, como para a incorporação da perspectiva de gênero na agenda política partidária.

Algumas medidas que certamente contribuirão para ampliar a participação das mulheres na política podem ser destacadas: incorporação das mulheres nos órgãos de direção partidária, com preenchimento, no mínimo, da cota de 30%; cumprimento da cota de, no mínimo, 30% para cada um dos sexos nas vagas de candidaturas para as eleições proporcionais; acolhimento das pautas feministas como compromisso do Partido; criação de instrumentos de comunicação para divulgar o trabalho político das mulheres; promoção de debates e cursos entre mulheres e homens do Partido sobre as relações de gênero; garantia de espaços para as militantes nas publicações e nos programas políticos gratuitos do PPS; destinação de recursos financeiros para a realização de planos de trabalho para o enfrentamento da questão colocada.

É urgente que o Partido implemente essas medidas e ações, visando contribuir para a superação dos obstáculos que se impõem à participação política das mulheres, à conquista da igualdade de gênero, e consequentemente, ao respeito aos direitos humanos.

Esperamos que o PPS possa atuar firmemente no sentido de superar a sua reduzida representação feminina nas esferas de poder do Estado. Que possa assumir o compromisso, através de suas lideranças e dirigentes, de ampliar a participação das mulheres no âmbito partidário, na sociedade civil organizada e também no Legislativo e no Executivo. Esta é uma excelente oportunidade para se lutar por uma sociedade democrática, justa e fraterna.
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Texto publicado em Textos Feministas 1989-2004. Grupo de Assessoria Feminista/PPS. Brasília – DF, março/04
Elizabete Barreiros é militante do PPS desde 1986 e integrante do Fórum de Mulheres do Distrito Federal.

As mulheres do PCB/PPS



As mulheres vêm lutando por paz, liberdade e justiça desde sempre em todo o mundo. Eu, como filha de um bolchevique dos anos vinte, quando ainda se levava a sério a obra de Marx “A religião é o ópio do povo”, não tive educação religiosa de espécie alguma e jamais li as Escrituras Sagradas. Mas nas muitas conversas que tive com o nosso querido Capitão Salomão Malina, este contava que em uma de suas prisões, só tinha permissão para ler a Bíblia. E segundo ele, já na Antigüidade apareciam figuras de mulheres fortes, defensoras de causas nobres.

As mulheres brasileiras também vêm lutando e se organizando ao longo dos séculos na resistência ao sistema escravagista colonial, contra a Inquisição, na luta pela independência, nos movimentos populares que enfrentam o poder ao longo do II Império, bem como as sufragistas já no século XX.

Para nos atermos a tempos menos remotos, ao ler o Germinal de Zola ou os livros “Nós, o Povo” ou a “História da Riqueza do Homem” de Leo Huberman, ou as obras de Karl Marx, nos damos conta que as mulheres proletárias trabalhavam em condições de alta periculosidade e insalubridade, cumprindo jornadas extenuantes desde os primórdios do capitalismo. Não deixa de ser emblemático que o episódio que deu origem ao 8 de Março, Dia Internacional da Mulher, é de 1857 enquanto o relativo ao 1º de Maio, envolvendo homens, é de 1886. De toda maneira, o ascenso das lutas sociais dos trabalhadores e trabalhadoras ao longo dos séculos XIX e XX dá ensejo a uma série de conquistas políticas e sociais, muitas delas consolidadas como direitos humano na Carta das Nações Unidas de 1948 e em documentos posteriores.

Os movimentos socialista e comunista internacionais sempre tiveram a luta pelos direitos das mulheres como uma questão central. E já em 1910, durante o II Congresso da Mulher Socialista, por iniciativa da revolucionária alemã, Clara Zetkin, o dia 8 de Março foi consagrado como o Dia Internacional da Mulher. A Revolução Bolchevique de 1917 produziu figuras como Alexandra Kolontai que discutia no começo do século XX teses como “A nova mulher e a moral sexual”. Com o advento do stalinismo esta renovação foi congelada embora muitas conquistas sociais tenham permanecido. Não podemos deixar de mencionar a teórica marxista polonesa e militante da social-democracia alemã, Rosa Luxemburg que polemizava com Lênin, sobretudo sobre a questão da democracia socialista e a grande dirigente comunista espanhola Dolores Ibarruri, uma mulher do povo e figura popular no período da Guerra Civil Espanhola.

Mas como afirma Eric Hobsbawm , “os direitos não são abstratos, universais e imutáveis. Eles existem nas mentes de homens e mulheres como partes de conjuntos especiais de convicções sobre a natureza da sociedade humana e sobre a ordenação das relações entre os seres humanos dentro dela: um modelo de ordem social e política, um modelo de moralidade e justiça.”

Durante o século XX assiste-se a grandes mudanças quanto às mulheres. A mobilização dos homens para as duas grandes guerras mundiais incorpora cada vez mais mulheres ao mundo do trabalho. Mas é a partir dos anos 60, com o advento da pílula anticoncepcional que as famílias passam a ter maiores possibilidades de planejamento familiar, permitindo a incorporação de um maior contingente feminino ao mundo do trabalho e da cultura num momento de crescimento da economia capitalista. As mulheres que já haviam conquistado em quase todo o mundo o direito ao voto, passam a reivindicar direitos de igualdade no seio da família, no plano econômico e político. A década de 70 constitui um marco para o movimento de mulheres. Em 1975 comemora-se em todo o Planeta o Ano Internacional da Mulher e realiza-se a I Conferência Mundial da Mulher, promovida pela Organização das Nações Unidas – ONU, instituindo-se a Década da Mulher. Este movimento vai num crescendo e na década de 90 temos várias Conferências Mundiais da ONU tais como a dos Direitos Humanos (Viena –1993), População e Desenvolvimento (Cairo – 1994), Mulheres, Igualdade, Desenvolvimento e Paz (Beijing – 1995 e a Convenção Pan-americana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher (Belém do Pará – 1994), da Organização dos Estados Americanos – OEA. O avanço tem sido maior no plano social do que no político. De toda maneira, sem entrar no mérito da posição política, hoje mulheres presidem os Partidos Comunistas da França, do Uruguai e do Chile, o Partido do Socialismo Democrático da Alemanha. As mulheres constituem quase metade dos cargos de direção dos Democratici di Sinistra na Itália. O Partido de la Revolución Democrática do México acaba de ter duas gestões seguidas presididas por mulheres. O caso mexicano é interessante uma vez que a legislação eleitoral do país, onde grande parte dos cargos parlamentares são preenchidos por lista fechada e não há possibilidade de reeleição em mandato consecutivo, permite forjar muitas lideranças e de acordo com o estatuto do PRD as listas são preenchidas numa seqüência de dois homens, uma mulher o que garante cerca de 30% dos mandatos para as mulheres. É uma maneira muito mais efetiva de eleger mulheres que as nossas cotas.

É claro que o Brasil participa de alguma maneira de toda esta trajetória internacional. Gostaria, porém, de fazer uma outra reflexão. Por mais avançado que um partido possa ser, ele sempre será um reflexo da sociedade que busca representar. Ora, no caso brasileiro, com uma tradição patriarcal, autoritária e machista muito arraigada, o PCB avança com dificuldade desde os seus primórdios. Se a clandestinidade, as prisões e a tortura ainda deixam muitas lacunas na história do nosso Partido, a das mulheres comunistas é mais desconhecida de todos. Esta história ainda terá que ser retirada das catacumbas. Creio que as mulheres de cada estado brasileiro deveriam assumir como tarefa a busca de raízes e tentar descobrir como e onde atuaram as mulheres do Partido. Provavelmente cometerei injustiças por omitir nomes. Mas mencionarei o que considero como o "estado da arte” da pesquisa neste momento. Para tanto contei com a contribuição de Francisco Inácio Almeida, João Aveline, José Cláudio Barriguelli, Marcos Del Roio e Paulo R. Cunha, entre outros.

São poucas as mulheres que militaram no Partido na primeira década de sua existência. Isto pode ser atestado por uma carta enviada pela IC, reclamando da pequena participação feminina. Apesar de tudo, para surpresa de todas nós, tendo acesso recente a um arquivo referente a brasileiros e brasileiras que tiveram atuação junto à Internacional Comunista, lá consta o ingresso da paraense Erecinha Borges de Souza no PCB em 1927; foi membro do CC e do seu Bureau Político entre janeiro de 1931 e agosto de 1932. Acabou indo a Moscou, onde assumiu tarefas no Secretariado da América do Sul e Central. Casou-se com um companheiro do PC dos EUA e fixou residência em Nova York onde trabalhou nas organizações da “American League for Peace and Democracy, Special Committe for Friends of Brazil”. A poetisa Laura Brandão, também teve uma atuação destacada, sobretudo em prol dos direitos das mulheres.

A partir dos anos trinta, com a ascensão do fascismo no mundo, as mulheres se mobilizam para trabalhar no Socorro Vermelho Internacional, contra a ditadura Vargas e pela paz mundial. Sara (Becker) de Mello, as irmãs Inês (Itkis) Besouchet e Felícia (Itkis) Schechter e Raquel Gertel já vem atuando desde 1930. Esta última é personagem dos Subterrâneos da Liberdade de Jorge Amado. Ao longo da década, ingressaram no PCB figuras como Eugênia Moreira, primeira repórter mulher do país e fundadora da União Feminina do Brasil; Patrícia Galvão, jornalista, poetisa e ativista política; a conceituada psiquiatra alagoana Nise da Silveira; a escritora paraense Eneida de Morais; a escritora cearense Raquel de Queiroz e a advogada carioca Maria Werneck. A juventude e o mundo da cultura estão presentes no Partido desde o início.

No final de 1934 o PCB tomou a iniciativa de desenvolver negociações para a criação da Aliança Nacional Libertadora, Frente Popular contra o integralismo e a legislação discricionária. Esta é fundada em março de 1935. No bojo da ANL organizou-se a União Feminina Brasileira que lutava pela igualdade social e de direitos entre os sexos. As principais dirigentes desta entidade foram as já mencionadas Maria Werneck e Nise da Silveira, bem como Catharina Landeberg, Priscila Motta Lima e Amanda Alberto Abreu.

Cabe uma menção às mulheres imigrantes, que já vinham militando em partidos europeus e aqui deram continuidade a suas atividades num novo ambiente como Liuba Goifman, Rifka Gutnik e Tuba Schor. Liuba e seu esposo foram presos em 1936 e só não foram deportados porque tinham um filho nascido no Brasil. O esposo de Rifka, Waldemar Gutnik foi deportado, mas este fato não foi motivo para esmorecer; a luta continua. A jovem Geny Gleiser também foi deportada devido às atividades políticas que exercia no PCB.

Olga Benário, companheira de Prestes, e Lisa Berger não vieram como imigrantes mas a serviço da III IC – Internacional Comunista. Ambas foram entregues às garras nazistas; Olga foi executada numa câmara de gás e Lisa morreu tuberculosa devido aos maus tratos, no Campo de Concentração de Ravensbruck.

Algumas companheiras como a professora goiana Glória Pilomia participam da reorganização partidária pós liquidação do PCB no início dos anos 40. Mas é no pós II Guerra Mundial que as mulheres mostram a cara. É um momento de grande efervescência partidária e nos movimentos populares. Inicialmente na luta pela Anistia Política no Brasil, e posteriormente, no Movimento pela Paz contra a Guerra na Coréia e contra as bombas nucleares. Destacam-se nestas tarefas Jovina Pessoa, Antonieta Campos da Paz, Elisa Branco e Branca Fialho. Escreve Aveline: “A coragem da mulher brasileira se fez presente na manhã do dia 7 de setembro de 1951, quando Elisa Branco na frente das tropas que desfilavam em comemoração à data da Independência, desfraldou uma faixa onde se lia: “Os soldados, nossos filhos, não irão para a Coréia”. Era o sinal de que estava sendo desencadeada naquele momento a campanha nacional comandada pelo PCB, que visava impedir o envio de tropas para a Coréia, uma exigência dos Estados Unidos, para dividir com o Brasil e outras nações do Continente, a responsabilidade pela agressão ao povo coreano.” A campanha foi vitoriosa embora Elisa enfrentasse dois longos anos de prisão e Zélia Magalhães, no vigor dos seus vinte e poucos anos, tenha tombado no Rio de Janeiro, durante jornada do Movimento dos Partidários da Paz, pela ação criminosa dos policiais de Felinto Müller.

Com a democratização do país e a legalidade do PCB, várias mulheres foram eleitas deputadas e vereadoras. Zuleika Alambert, eleita deputada estadual por São Paulo com pouco mais de vinte anos, representou na Assembléia Legislativa os interesses da juventude. Anos depois, foi durante alguns anos dirigente destacada do Comitê Central do PCB. Adalgisa Cavalcanti foi eleita Deputada Estadual em Pernambuco. Julieta Batistioli, uma simples operária da indústria têxtil, foi a primeira vereadora da capital gaúcha, em 1946; deixou perplexos os demais representantes daquela legislatura pela clareza com que abordava os problemas, muitas vezes desconhecidos pelos demais. Elisa Kaufman Abramovich, pedagoga, foi a vereadora mais votada para a Câmara Municipal de São Paulo e líder da bancada. Com o advento da Guerra Fria e a cassação do registro do PCB e dos mandatos dos parlamentares, Elisa colaborou com o aparato clandestino na medida em que matriculava na escola que dirigia, os filhos de membros do CC na mais estrita clandestinidade tais como Salomão Malina, Jacob Gorender, Moisés Vinhas e Marco Antonio Tavares Coelho.

As mulheres também dirigem revistas e escrevem para os jornais partidários; entre elas, a poetisa Ana Montenegro, Arcelina Mochel, redatora do jornal Momento Feminino e Eunídia Mathias da Tribuna Gaúcha. Antonieta Campos da Paz edita a página feminina do jornal Imprensa Popular, no Rio de Janeiro.

Data desta época a fundação da Federação das Mulheres do Brasil. Destacam-se nesta frente Ana Montenegro, uma das responsáveis pela criação da Federação em 1949 e Alice Tibiriçá, primeira presidente da mesma. No exílio, pós 64, Ana Montenegro representará o Brasil na Federação Democrática Internacional de Mulheres – FEDIM. Destacam-se ainda nos movimentos populares contra a carestia, pela paz, pela escola pública e pela reforma agrária e nas lutas operárias que culminam nas grandes greves dos anos 50, na indústria têxtil e da alimentação, Maria Salas, Adoración Vilar, Eunice Longo, Beatriz Nieto, Olinda Jardim, Lucrécia Correa, Angelina Jeronimo, Maria Bevilácqua e Erundina Arruda em São Paulo; a dirigente municipal de Uberlândia e mais tarde presidente da organização de mulheres Olívia Calábria, que dá continuidade a projetos da Paz e na defesa dos minérios nacionais, também participa dos movimentos sociais no Triângulo Mineiro; as irmãs Irma e Noêmia Gouveia; Julia Santiago, líder sindical têxtil de Pernambuco.

Mas a mulher também luta nas difíceis condições do campo. São exemplos desta luta Aparecida Azedo, sobrevivente da chacina de Tupã; Dirce Machado, grande líder dos posseiros no conflito de Trombas e Formoso; Margarida Maria Alves, Presidente do Sindicato Rural de Alagoa Grande e Josefa Paulina da Silva, líder camponesa e comunitária no Estado do Rio de Janeiro e ex candidata a deputada federal pelo PCB. Outra luta difícil se dá contra o racismo: Maria Brandão dos Reis, negra mineira, é ativista social e política nesta área.

Além das mulheres do mundo da cultura que se agregam ao Partido nos anos trinta, no período posterior a 45, surgem personalidades como a médica maranhense Maria Aragão, figura popular, agitadora política e figura marcante dos comunistas na cidade de São Luís; a cientista e intelectual pernambucana, Naíde Teodósio; a escritora Edith Hervê e a musicista Esther Scliar, gaúchas; a cantora popular Nora Ney.

Apesar das dificuldades de grande monta surgidas com o golpe de 64, o PCB acompanha a verdadeira revolução empreendida pelas mulheres em nível mundial. Há um novo entendimento da questão feminina – não basta inserir-se nas lutas gerais do povo, ao contrário, as feministas apontam as especificidades neste campo. Ainda antes da Anistia, a Dra. Albertina Duarte cria o Centro da Mulher Brasileira com o apoio de Maria do Carmo Alves de Lima no Ano Internacional da Mulher. Mas é em 1979 que surge um dos mais importantes documentos do PCB sobre a condição feminina com a contribuição decisiva de Zuleika Alambert.

São muitas as mulheres com grande atividade no PCB e posteriormente no PPS a partir dos anos 80. Artistas como Lícia Caniné, a Ruça, (ex-vereadora no Rio de Janeiro), Beth Mendes (ex-deputada federal constituinte); a pintora e escritora Sara Goldman Belz; a cantora Ana de Holanda; a escritora Dulce Pandolfi; médicas como Lúcia Souto (ex-deputada estadual do Rio de Janeiro), professoras, sociólogas como Almira Rodrigues, dirigente da ONG feminista CFêmea em Brasília; a jornalista Cíntya Peter, transmitiu diretamente de Moscou os momentos dramáticos da Perestroika; Abigail Paschoa, feminista e ativista da comunidade negra; vereadoras, deputadas, senadora, prefeitas e vices como Linda Monteiro, em Goiânia, as mulheres estão em toda parte. Seu número aumentou de maneira expressiva e seria temeroso enumerá-las todas.

Mas todo este movimento não se constitui apenas de heroísmo e abnegação. Há conflitos e equívocos ao longo do tempo. Em cada cisão, perdia-se quadros: Elza Monerat e Lila Ripol para o PCdoB; Clara Charf, companheira de Marighella para a ALN (hoje no PT); Isis de Oliveira e Maria Aurora Furtado, a Lola, jovens barbaramente torturadas e assassinadas, optaram pela luta armada; Elisa Branco e Jovina Pessoa na cisão de Prestes; Zuleika Alambert faz parte do grupo derrotado no VII Congresso junto com Armênio Guedes e Davi Capistrano Filho, entre outros; Ana Montenegro na grande mudança empreendida no IX e X Congressos.

Contudo não existe vácuo na política. Surgem novas lideranças, com capacidade melhor de analisar o passado e o presente, dispostas a lutar por um mundo melhor nas novas condições vigentes. Prestemos nossa homenagem às mulheres do passado e às novas militantes dispostas a lutar no presente. Ainda somos poucas, mas vamos à luta porque os desafios são enormes dentro do PPS e na sociedade mais geral. Com o apoio dos companheiros, esperamos crescer e nos fortalecer, aumentando nossa representação dentro do Partido e junto à sociedade.

Palestra proferida na abertura do I Encontro Nacional de Mulheres, realizado em Brasília, nos dias 13 e 14 de setembro de 2003.

Dina Lida Kinoshita - Física, ambientalista, membro da Cátedra Unesco para a Educação para a Paz, Direitos Humanos, Democracia e Tolerância, do Instituto de Estudos Avançados da USP, é membro da Executiva Nacional e da Comissão de Relações Internacionais do PPS.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Um giro pelo mundo

TEXTOS BÁSICOS SOBRE A SITUAÇÃO DA MULHER NO MUNDO
É sempre importante se firmar a posição de igualdade até que sejamos ouvidas por todos. Perfeito o pensamento de Thiago de Mello: "Não somos melhores nem piores. Somos iguais. Melhor é a nossa causa."

Creio que em nenhum lugar do mundo os movimentos que promovem o empoderamento da mulher e que trazem em seu discurso o fortalecimento da democracia como, por exemplo, as palavras de uma legisladora da Irlanda citada num estudo abaixo: "A nossa democracia está incompleta quando as mulheres estão ausentes da formulação de políticas." embute a pretensão de que o mundo só poderá ser melhor com as mulheres no poder. Não se vê, lê ou ouve essa afirmação partindo de pessoas que estão de fato e de direito na luta por transformações no mundo para vivermos em espaços mais justos entre homens e mulheres.

Não somos e nem temos a pretensão de sermos a salvação do mundo, mas que ajudar fazendo leituras políticas do nosso jeito e da nossa forma e colaborarmos para avanços significativos no mundo da política, disso não tenho dúvida.

Boas leituras para todas,

Tereza Vitale

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DEMOCRACIA INCOMPLETA

Miriam Mannak CIDADE DO CABO, 29 de Abril(IPS)

Um novo relatório da União Inter-Parlamentar (UIP), sediada em Genebra, revelou que as mulheres estão a modificar as prioridades e, por vezes, até o espírito das legislaturas em todo o mundo. Mas também realça a lentidão com que aumenta o número dos assentos parlamentares detidos por mulheres. Em 1975, quando a primeira Conferência Mundial das Nações Unidas sobre as Mulheres se realizou na Cidade do México, cerca de 11 por cento dos lugares nas legislaturas com uma única câmara e nas câmaras baixas parlamentares eram ocupados por mulheres. Até 2008, houve pouco avanço a este respeito: nesta altura, um pouco menos de 18 por cento dos legisladores em todo o mundo são do sexo feminino, uma proporção muito mais baixa do que os 30 por cento considerados necessários para que as mulheres comecem a influenciar o curso dos assuntos parlamentares.A representação eqüitativa das mulheres nas legislaturas é obviamente "um ideal, não uma realidade", aponta o relatório, intitulado 'Igualdade na Política: Levantamento das Mulheres e dos Homens nos Parlamentos'.

O estudo examina a igualdade do género nas legislaturas a partir de diversas perspectivas, com base em respostas provenientes de aproximadamente 300 deputados (40 por cento dos quais do sexo masculino) em 110 países – e segue um relatório semelhante publicado em 2000, intitulado 'Política: Perspicácia Feminina'.

O relatório 'Igualdade na Política' foi divulgado durante a 118ª assembléia da UIP, realizada entre 13 e 18 de Abril numa cidade portuária sul africana, a Cidade do Cabo. A União é uma organização que abrange Parlamentos de todo o mundo.A limitada representação de mulheres nas legislaturas deve ser estudada em conjunto com tendências nacionais e regionais mais promissoras, admite o relatório.

Por exemplo, tem havido avanços em África e na Ásia, onde cerca de 17 por cento dos assentos parlamentares são agora ocupados por mulheres. A nível mundial, o Ruanda está à frente a este respeito, representando as mulheres cerca de 49 por cento dos lugares na câmara baixa do Parlamento.Quanto a países que conseguiram que as mulheres ocupassem mais de 30 por cento dos lugares parlamentares, metade são países em vias de desenvolvimento."Os países em vias de desenvolvimento e países emergentes têm demonstrado um grande progresso, ao passo que a situação nas ditas velhas democracias não tem avançado muito," afirmou o Secretário-Geral da UIP, Anders Johnsson.Mas globalmente, observa o relatório, "...apenas uma pequena porção das mulheres elegíveis considera propôr-se a eleições parlamentares." Em geral, as pessoas entrevistadas apontaram a falta de apoio dos eleitores como o principal factor que dissuadia os homens de entrarem na política. Para as mulheres, eram as responsabilidades domésticas: um terço das deputadas entrevistadas não tinha quaisquer dependentes, sendo duas vezes mais provável que fossem solteiras quando comparadas com os homens.

Gwendoline Mahlangu-Nkabinde, vice-presidente da Assembléia Nacional sul africana, declarou, "Em muitos países, especialmente em África, os rapazes são criados de forma diferente das raparigas. Os rapazes são criados com a mentalidade que não precisam de lavar pratos, porque as irmãs o farão por eles."Quando solicitados a discutirem medidas que pudessem levar à eleição de um maior número de mulheres, os deputados falaram em parte da necessidade de alterar as percepções sobre o lugar das mulheres na sociedade através de programas educativos – e de contemplar a introdução de instalações de acolhimento de crianças como forma de ajudar as mulheres a ultrapassarem as dificuldades especiais que enfrentam para financiar as suas campanhas eleitorais.

O relatório também realça a utilidade das quotas para o género como forma de introduzir um maior número de mulheres nas legislaturas, e como os sistemas eleitorais baseados na representação proporcional têm conseguido a eleição de mais mulheres do que os escrutínios baseados em círculos eleitorais. Mas o estudo também aponta as preocupações dos candidatos a deputados quanto à sua colocação em posições nas listas partidárias que lhes permitam obterem um assento parlamentar."Muitos partidos funcionam sem regras claras sobre a selecção de candidatos..." afirma o estudo. No entanto, "A forma como os candidatos são seleccionados pelos partidos políticos é importante. Se as regras partidárias para a selecção de candidatos não forem claras, as decisões serão tomadas pelas elites partidárias, normalmente do sexo masculino."

O tornar-se parte da elite coloca os seus próprios desafios: "Os partidos políticos são normalmente órgãos fechados e muitos mantêm redes de contactos masculinas que dificultam a entrada das mulheres na liderança partidária."Estas observações foram repetidas por Johnsson: "Portanto, não é apenas a sociedade e a estrutura parlamentar que precisam de se adaptar e evoluír de modo a permitir a entrada de mulheres; os partidos políticos também precisam de se sentarem à mesa."

PRIORIDADES LEGISLATIVAS

Diversas pessoas entrevistadas para o relatório declararam que homens e mulheres pareciam partilhar certas prioridades políticas; no entanto, muitas mais apontaram prioridades diferentes entre legisladores do sexo masculino e do feminino. As questões que preocupavam as mulheres incluíam a redução da pobreza, pensões, direitos reprodutivos, cuidados com as crianças e violência relacionada com o género: "A luta contra a violência contra as mulheres é uma área onde os legisladores do sexo feminino fizeram sentir a sua presença em todas as regiões do mundo."

Segundo Yassina Fall, assessora económica superior do Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para as Mulheres, "As mulheres compreendem o que é que as outras mulheres precisam. Conhecem os desafios que as mulheres e as raparigas enfrentam e compreendem o impacto que estes desafios têm nas suas vidas.""Elas apercebem-se que, quando se capacitam as mulheres, capacita-se a sociedade," acrescentou.

Observações semelhantes foram feitas por Johnsson: "Diversos entrevistados do sexo masculino disseram que as mulheres – muitas mulheres – são necessárias para haver um parlamento que sirva a população."

No entanto, o relatório afirma que, embora os legisladores do sexo femino pareçam estar a tomar a iniciativa no que diz respeito à introdução de questões importantes para as mulheres, estas questões não constituem as suas únicas preocupações.Além disso, as deputadas podem sentir dificuldades para traduzir as suas prioridades em mudanças políticas, por vezes devido a partidos no poder pouco compreensivos – mas também porque a sua limitada presença nas assembleias as impede de participar plenamente nas comissões parlamentares que examinam cuidadosamente as leis."

As mulheres são excluídas das discussões sobre formulação de políticas devido à sua ausência física, ou então estão sobrecarregadas com o trabalho das comissões, o que quer dizer que, em última análise, não podem dedicar tempo suficiente às comissões e respectivos pedidos de informação."

Entre diversas outras observações, o relatório 'Igualdade na Política' refere que, para haver uma mudança substancial no que diz respeito à representação das mulheres nas legislaturas, tem de haver vontade política nesse sentido. "Homens e mulheres devem concordar e reconhecer que a inclusão e a participacão equitativa das mulheres nos processos parlamentares não só beneficiam as sociedades...mas são também necessárias para legitimar a democracia."

Ou, nas palavras de uma legisladora da Irlanda citada no estudo: "A nossa democracia está incompleta quando as mulheres estão ausentes da formulação de políticas." (FIN/2008)
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IGUALDADE DE OPORTUNIDADES
Maria de Belém Roseira

"Não somos melhores nem piores. Somos iguais. Melhor é a nossa causa."Thiago de Mello

[...]A reflexão sobre a origem das desigualdades não sendo de hoje nem de ontem, é uma urgência de sempre. Um autor recente,analisando a temática no quadro da modernidade, enumera três grandes motivos para a emergência das desigualdades no mundo contemporâneo. Refere-se ele, antes de mais, ao próprio enfraquecimento do(s) princípio(s) de igualdade que estrutura(m) a sociedade, depois ao crescimento das desigualdades estruturais (resultantes das diferenças de rendimento, despesas, património, acesso à educação, etc...) e, por fim, à emergência de novas tipologias de desigualdades (fruto das evoluções técnicas, jurídicas, económicas ou de alterações na sua percepção).

Estamos, assim, perante um fenómeno multiforme e em constante devir cujo sentido e cabal compreensão escapará porventura à opinião comum.Contudo, as exigências que naturalmente decorrem da necessidade de coesão social e dos grandes princípios por que as sociedades democráticas da actualidade se pautam, impõem às instâncias políticas um agir que, ultrapassando as dimensões do diagnóstico, se projecta de forma esclarecida na antevisão e construção de um futuro melhor.

Na consciência dessa realidade e dando cumprimento ao Programa do XIV Governo Constitucional, a consignação da preocupação com a igualdade surge com a finalidade de se operar nesta legislatura, "um impulso decisivo na promoção da igualdade de oportunidades entre os homens e as mulheres" (Programa do Governo, 1999:10) tendo como pilar de acção o princípio conhecido por mainstreaming, que é " entendido como directiva de plena integração da temática da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres em todas as políticas sectoriais a prosseguir" (ibidem).

Esta grande aposta que caracteriza o programa do actual Governo concretiza-se numa inequívoca determinação de conceber a igualdade de oportunidades não como uma acção isolada e/ou marginal às outras políticas, mas integrando-as, permitindo assim, numa dimensão de transversalidade, a sua efectiva aplicação nas políticas económicas, sociais e estruturais nacionais e também comunitárias.

É do domínio comum que, ainda que aparentemente neutras em termos de igualdade, as decisões políticas podem repercutir-sediferencialmente nas condições de vida das mulheres e dos homens. Neste sentido e a nível mundial têm-se verificado evoluções significativas em ordem a promover a igualdade de oportunidades. Não me refiro, por agora, tanto à Declaração Universal dos Direitos Humanos quanto a outros instrumentos mais recentes e com assinalável capacidade vinculativa para os Estados-membros seus signatários e que são, entre outros, a Plataforma de Acção adoptada na sequência da IV Conferência Mundial das Mulheres, realizada em Pequim em 1995, que instou os governos e outros agentes relevantes a "integrar uma perspectiva de género em todas as políticas e programas de modo a que antes da tomada de decisão seja efectuada uma análise dos possíveis efeitos nas mulheres e nos homens". E, respeitando a cronologia, mas ultrapassando a Declaração de Istambul (Conselho da Europa) evoco o Tratado de Amsterdão por formalizar o compromisso de integração da dimensão da igualdade de oportunidades a nível comunitário, ao mencionar explicitamente entre as tarefas e os objectivos da Comunidade a eliminação das formas e ocasiões de discriminação e a promoção da igualdade entre homens e mulheres (artº 2º e 3º ).

Para equacionar, em toda a sua profundidade a problemática em apreço, começaremos por lembrar que basicamente igualdade não é identidade, e que reflectir sobre a mesma leva, inevitavelmente, à pergunta sobre a natureza humana, sobre o que é ser mulher e /ou ser homem.

O processo de afirmação da igualdade de oportunidades, nos seus desenvolvimentos mais recentes, e atendendo à sua peculiaridade, lançou mão de uma terminologia própria que importa referir e considerar para mais adequada articulação do pensamento e pleno acesso à essência da questão. Assim, muito embora o sexo seja uma forma de diferenciação biológica universal entre os humanos, há uma outra instância distintiva que urge ter em conta e superar: o género, uma categoria socialmente construída e inculcada em função de vectores como o tempo, o lugar, as representações sociais, as perspectivas e expectativas relativamente à vivências das mulheres e dos homens. Trata-se daquilo que os franceses designam, numa expressão porventura mais feliz, por "rapports sociaux de sexe".

A política para a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres pretende neutralizar e/ou ultrapassar as barreiras, visíveis e invisíveis que existem ou poderão surgir no acesso de mulheres e homens, em condições de igualdade, à participaçãoeconómica, política e social. Para tal socorre-se do conceito operacional de igualdade de género, por virtude do qual tende a defender e promover a ideia de que todos os seres humanos, mercê da dignidade inerente à sua natureza, são livres de desenvolver as suas capacidades pessoais e de fazer opções, muito para além dos papéis social e culturalmente atribuídos a mulheres e homens. Sabemos, contudo, que não se atingem os referidos objectivos por força de muito os desejar, nem tão pouco por meros artifícios de magia, mas tão somente por um longo processo que consistirá numa adequada implementação de uma cultura de igualdade e, por conseguinte, uma adequada integração da perspectiva de género (=mainstreaming) em toda a vida social e política.

Tentando precisar diremos que se trata de uma forma institucionalmente estatuída e organizada em ordem a garantir que o que se passa na cena política e na vivência social tem neutralidade de género ( significando que não influi de modo diferencial, negativa ou positivamente na igualdade entre homens e mulheres). Em ordem à consecução de tal objectivo deve a instância política a quem foi cometida tal atribuição evidenciar uma especial sensibilidade para a relevância de género, ajuizando sobre a pertinência para as relações de género de uma determinada política ou acção específica. Compete-lhe mesmo uma acção de (I) planeamento em função de género, entendida como uma abordagem que procura incorporar explicitamente uma dimensão de género nas políticas e acções; (II) verificação da integração da perspectiva de género, ou seja o procedimento tendente a assegurar a ausência de efeitos potencialmente discriminatórios em termos de género, decorrentes dessa política, bem como a promoção da igualdade de género; (III) e comprovação da integração da perspectiva de género - análise e avaliação das políticas, programas e instituições quanto aos modos de aplicação dos critérios associados ao género.

Mercê da acção complementar dos procedimentos descritos se promove o objectivo fundamental: a equidade entre géneros - uma forma de justiça no tratamento entre homens e mulheres, podendo tratar-se de tratamento igual ou outro, que não o sendo, é considerado equivalente em termos de direitos, benefícios, obrigações e oportunidades.

A comparação dos textos constitucionais existentes na actualidade evidencia, em relação à problemática da igualdade quatro situações distintas: a dos textos que se circunscrevem à declaração do princípio de igualdade; a daqueles que se referem expressamente à igualdade de direitos entre homens e mulheres; a dos que afirmam a igualdade de participação política de ambos os sexos; e, por fim, o do conjunto de textos que consentem e/ou promovem medidas positivas em favor de ambos os sexos.

Portugal que passou por todas estas fases, vê-se, mercê da Revisão Constitucional de 1997, entre os países mais avançados nesta área, muito embora a sua prática ainda não se coadune com o legalmente preceituado. Na verdade, a Constituição da República Portuguesa, por força da nova alínea h) do seu artigo 9º, passou a considerar como "tarefa fundamental do Estado" a "promoção da igualdade entre homens e mulheres". Estamos assim perante medidas destinadas a eliminar e prevenir a discriminação e/ou compensar as desvantagens decorrentes de atitudes, comportamentos e estruturas existentes, procedimento que vulgarmente se designa por discriminação positiva. A igualdade de tratamento entre mulheres e homens é um princípio fundamental dos actuais ordenamentos jurídicos, sendo por conseguinte uma componente de pleno direito da cidadania.

Tendo presente o nosso texto constitucional, é inequívoca a competência e obrigação do Estado relativamente a uma acção declarada no âmbito da implementação de acções de discriminação positiva em ordem à promoção de igualdade de oportunidades.

Trata-se, contudo, de uma realidade com dinâmicas específicas e aspectos multiformes cuja implementação, acompanhamento e avaliação não se compadecem com voluntarismos nem imediatismos. Na verdade, a instauração do princípio de igualdade não pode ser apreciada num dado instante, mas só em relação a uma tendência. Mais, a sua qualidade de projecto de sociedade, é um objectivo que tem que ser procurado com persistência, tão numerosos são os obstáculos com que naturalmente se depara.

A institucionalização da preocupação com a igualdade de oportunidades é, no fundo uma concretização daquela eterna busca de sentido e de futuro que caracteriza o ser humano no seu viver, em suma no seu contínuo ofício de construtor de novos imaginários.

Igualdade dos sexos mais respeitada no Norte da Europa

Os países do Norte da Europa são os mais respeitadores da igualdade entre homens e mulheres, segundo um estudo do Fórum Económico Mundial que coloca Portugal no 23º posto entre 58 países. A Suécia aparece no topo, à frente da Noruega, Islândia, Dinamarca e Finlândia. Nova Zelândia, Canadá, Reino Unido, Alemanha e Austrália ocupam as cinco posições seguintes. Portugal aparece atrás de países como a Letónia, Lituânia, França, Holanda, Estónia, Irlanda ou Polónia, e à frente da Hungria, República Checa, Luxemburgo, Espanha ou Áustria. Entre os 58 países estudados, as portuguesas estão em 18º lugar no acesso ao mercado de trabalho, em 20º no acesso à saúde, em 27º na participação económica, em 31° no acesso ao poder político. O relatório refere, no entanto, que nenhum país conseguiu eliminar as desigualdades entre homens e mulheres. O estudo incluiu os 30 países membros da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) e outros 28 mercados emergentes. O inquérito baseou-se em cinco critérios participação económica, oportunidade económica , acesso ao poder político, a aquisição de saber e saúde e bem-estar.

AS MULHERES E O MOSAICO DO DESENVOLVIMENTO HUMANO

A luta inexorável pela igualdade dos sexos mudará a maior parte das actuais premissas da vida social, económica e política. Acabar com a desigualdade dos sexos nada tem a ver com o rendimento nacional. O rendimento não é o factor decisivo. Várias nações pobres do mundo têm conseguido aumentar as taxas de alfabetização feminina. Com recursos limitados mas com um forte compromisso político, a China, Sri Lanka e Zimbabwe aumentaram a alfabetização feminina para 70% ou mais. Em contrapartida, vários países ricos ficaram para trás. Enquanto as portas para as oportunidades na educação e na saúde se abriram rapidamente para as mulheres, as portas das oportunidades na economia e na política estão apenas entreabertas. O maior índice de rejeição é o facto de muitas das contribuições económicas da mulher serem grosseiramente subavaliadas ou desvalorizadas—na ordem dos 11 biliões de dólares. A contribuição não-monetarizada, invisível das mulheres é de 11 biliões de dólares por ano. Outro elemento importante da discriminação é o inaceitável baixo estatuto das mulheres na sociedade com a contínua discriminação legal e a violência a que estão sujeitas. Os estudos levados a cabo no Canadá, Nova Zelândia, Reino Unido e Estados Unidos, sugerem que uma em cada seis mulheres é violada. Os dados referentes a África, América do Sul, várias ilhas da Melanésia e Estados Unidos apontam a violência conjugal como a principal causa do suicídio feminino. Os estudos levados a cabo em Barbados, Canadá, Paises Baixos, Nova Zelândia, Noruega e Estados Unidos, revelam a existência de abusos sexuais durante os primeiros anos e a adolescência.

É pouco provável que o livre funcionamento dos processos económico e político conduzam à igualdade de oportunidades. A revolução pela igualdade dos sexos deve ser impulsionada por uma estratégia concreta pela aceleração do progresso. A intervenção do estado é necessária—através de orientações políticas e de acções afirmativas. Incentivar os homens a participar no cuidado da família. Permitir horários de trabalho flexiveis.

Alguns países criaram hábitos de «tempo flexível» para permitir aos trabalhadores combinar necessidades familiares com horários de produção. É necessário alargar o conceito de serviço público. Alguns países têm alargado o conceito de serviços públicos para além da educação e saúde indo até à assistência infantil— tais como centros públicos de assistência diurna e almoços na escola.

A nova ordem mundial tem que pôr as pessoas — mulheres e homens — no centro de todos os processos de desenvolvimento.

Nos países em desenvolvimento a escolaridade conjunta no primário e secundário de raparigas aumentou de 38% para 68% nas últimas duas décadas. Nestes países durante as últimas duas décadas, as taxas de fertilidade diminuíram mais de um terço. A mortalidade materna nos países em desenvolvimento, de 350 por 100.000 nados vivos, é cerca de nove vezes maior do que nos países da OCDE. Nos países em desenvolviemto as mulheres detêm apenas cerca de 10% dos lugares parlamentares.

Nos países industrializados na ciência e tecnologia no ensino superior, o número de raparigas por cada 100 rapazes mais do que duplicou, de 25 em 1970 para 67 em 1990. Nestes países as mulheres representam agora mais de 40% da força de trabalho e detêm 28% das posições administrativas e de gestão. Nos países industrializados a taxa salarial não-agrícola de mulheres é apenas três quartos da dos homens. Nestes países as mulheres detêm apenas 12% dos lugares parlamentares.

Desde a criação do Prémio Nobel em 1901 e até 1992, dos 634 prémios individuais apenas 28 foram atribuídos a mulheres, 12 das quais partilharam o prémio com homens. oito mulheres receberam o prémio Nobel da literatura (91 atribuídos) a nove mulheres foi atribuído o prémio Nobel da paz (80 atribuídos). cinco mulheres (quatro em conjunto) foram reconhecidas em medicina ou fisiologia (158 atribuídos), quatro (duas em conjunto) em química (121 atribuídos), duas (em conjunto) em física (146 atribuídos). Nenhuma mulher recebeu o prémio Nobel em economia (38 atribuídos), um domínio exclusivamente masculino.

A Noruega, um dos primeiros países a garantir o sufrágio das mulheres, goza da reputação de ter um dos sistemas políticos com maior equilíbrio sexual do mundo. Políticas consultivas, mais do que confrontacionais, contribuiram para que a competição política se centrasse nos problemas, incluíndo os das mulheres. Essas mesmas políticas consultivas, centradas sobre problemas reais, elevaram a participação política de mulheres e homens. A igualdade não é um objectivo tecnocrático — é um compromisso político global. Não deve haver nenhuma tentativa de oferecer um modelo universal de igualdade sexual. As interpretações de alguns direitos são diferentes em sociedades diferentes, dependendo das religiões, culturas ou tradições. Variam as preferências actuais das sociedades e a forma como as pessoas querem exercer as suas livres escolhas. Cada sociedade — e os movimentos activos dentro dela — devem debater se o resultado é aquilo que a sociedade realmente deseja ou um reflexo das barreiras estruturais que deviam ser retiradas.

O paradigma do desenvolvimento humano, que coloca as pessoas no centro das preocupações, teria pouco significado se não fosse completamente sensível aos sexos.

Fonte: relatórios sobre o desenvolviemto humano
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IGUALDADE DE SEXOS, NEM POR AQUI!

ESTOCOLMO, março 8 (AFP) - A Suécia pode estar no topo, em relacão à igualdade de gênero no parlamento, mas mais que a metade das 158 mulheres parlamentares afirmam ter sofrido discriminacão no trabalho.

Quase a metade dos 349 representantes parlamentares suecos são mulheres, mas isso não significa que o poder no país escandinavo está realmente dividido igualmente entre os sexos, de acordo com uma pesquisa realizada pelo jornal diario Svenska Dagbladet, com 155 das 158 mulheres do parlamento.

De acordo com a pesquisa, seis em cada 10 representantes parlamentares femininas afirmam ter sido discriminados no trabalho.

Independente do partido e idade, as parlamentares suecas reclamaram de ter sido preteridas ou mesmo desrespeitadas, por serem mulheres.

"É mais difícil do que eu pensava que seria. A estrutura masculina de poder prevalece profundamente. Eu fiquei chocada", afirmou uma parlamentar, que pediu para não ser identificada.

O problema principal, de acordo com muitas das mulheres ouvidas, é que os homens reunem-se em redes informais, baseadas principalmente em velhos laços de amizade, e tomam várias decisões sem consultar suas parceiras mulheres, no parlamento.Uma parlamentar disse à Svenska Dagbladet que este sistema é tão ruim que beira a "corrupcão".

A maioria das mulheres disse também que teve que trabalhar duas vezes mais que os homens para impor respeito.

Ainda anonimamente, uma mulher queixou-se que tinha sido introduzida como "uma jovem e bela adição" à casa, quando juntou-se ao parlamento, Enquanto que uma outra mulher reclamava que tinha sido dito que ela era "uma gracinha, quando estava irritada."

Fonte: http://www.sweden.se/
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ELIMINAÇÃO DA DISCRIMINAÇÃO DOS SEXOS E O AUMENTO DO PODER DAS MULHERES
Por Paulo Oliveira 11/12/2006

A UNICEF indicou que a eliminação da discriminação dos sexos e o aumento do poder das mulheres terão um impacto significativo na sobrevivência e no bem estar das crianças.

Aquela agencia das Nações Unidas acaba de divulgar o relatório sobre o estado das Crianças no Mundo que coincidiu com o sexagésimo aniversário da agencia.

O relatório da UNICEF destaca que a igualdade dos sexos e o bem estar das crianças é interligada, tendo o autor do documento, David Anthony sublinha que a igualdade de sexos beneficia tanto as mulheres como as crianças.

‘Mulheres saudáveis, confiantes, educadas e com poder tendem a ter crianças saudáveis, educadas e com poder. Existem provas de que a educação da mãe, por exemplo, ou a influencia da mãe nas decisões do agregado familiar, relaciona-se com melhores índices de nutrição, acesso aos cuidados de saúde e índice de sobrevivência nas diferentes partidas do mundo.’

O estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa das Políticas Internacionais de Alimentação refere que no caso dos homens e das mulheres possuírem igualdade de influencia nas decisões, existiriam, no sudeste asiático mais de 13 milhões de crianças com menos problemas de nutrição.

Conclui igualmente que quase dois milhões de crianças na África sub saariana estariam adequadamente alimentadas.

O documento indica ter existido progresso, nas ultimas décadas do estatuto das mulheres, mas que as vidas de raparigas e mulheres continuam a ser objecto de discriminação e pobreza. Refere que as raparigas e as mulheres são desproporcionadamente afectadas pelo HIV/SIDA, em particular no sul da África, onde são duplamente susceptíveis de serem infectadas pelo HIV.

O relatório acentua que o baixo estatuto das mulheres no sudeste da Ásia está na base do infanticídio feminino, que provoca um desequilíbrio dramático na demografia da região.
A UNICEF adianta que as mulheres na maioria dos casos ganham menos por trabalho igual ao dos homens, e que milhões de mulheres no mundo são objecto de violência física e sexual, sendo reduzido o recurso judicial. Devido à discriminação as raparigas têm menos possibilidades de ir a escola.

Anthony afirma que a igualdade em varias áreas chave ainda estão muito longe de minimizar a discriminação contra as mulheres e promover os direitos da criança.
‘Igualdade no seio do agregado familiar, igualdade no local de trabalho, igualdade nas estruturas governamentais e nos sistemas políticos. E ainda igualdade nas decisões, constitui algo necessário. Ao não assumir estas decisões cruciais, no caso das mulheres serem mantidas fora de decisões cruciais, e senão tiverem influencia sobre esses aspectos das suas vidas e das suas crianças, será então muito difícil combater a discriminação dos sexos.’

A UNICEF refere que um maior envolvimento das mulheres na política terá um impacto positivo no bem estar das crianças, existindo crescente numero de provas de que tanto no mundo industrializado como nos países em desenvolvimento sugerindo que as mulheres na política constituem advogadas eficazes das causas das crianças.
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BRASIL É 67º NO RANKING DE IGUALDADE ENTRE SEXOS
Por Rodrigo Craveiro

Correio Braziliense - 22 de novembro de 2006 - País exibiu fraca atuação nas áreas de educação e política, segundo estudo do Fórum Econômico Mundial. Suécia teve melhores índices

O Brasil ocupa a 67ª colocação no ranking da igualdade entre gêneros, com 0,654 pontos, atrás de Nicarágua (62º), Gana (58º), Uganda (48º) e Sri Lanka (13º). A escala varia de zero (desigualdade) a um (igualdade). No ano passado, o Brasil foi o 51º entre 58 nações avaliadas. Divulgado ontem pelo Fórum Econômico Mundial, o Relatório de Distância de Gênero analisa 115 nações e traz um dado alarmante: nenhum país conseguiu estabelecer as mesmas condições para homens e mulheres em áreas como educação, saúde, emprego e política.

As nações nórdicas — Suécia (1º), Noruega (2º), Finlândia (3º) e Islândia (4º) — detêm os melhores índices de igualdade entre os sexos. Famosos como o território das liberdades e da democracia, os Estados Unidos aparecem apenas em 22º lugar. Na outra ponta do ranking, com a fama de serem os locais onde a parcela feminina da população está longe de possuir os mesmos direitos da masculina, estão os muçulmanos Arábia Saudita e Iêmen.

O Índice Global da Distância entre Gêneros é medido com base em quatro áreas críticas de desigualdade: participação econômica e oportunidades, capacitação educacional, prestígio político e saúde. As mulheres das 115 nações analisadas pelo Relatório de Distância de Gênero — que abrangem 90% da população mundial — têm apenas 15% de representatividade política.

Segundo o documento, Brasil e México (75º) mantêm fracas atuações. “Ambos estão entre os 34 países que dividem uma colocação no topo, na categoria da saúde. Mas enquanto o Brasil está sendo empurrado para baixo, por causa da pobre performance na capacitação educacional (72º) e na representatividade política (86º), o México fica atrás na participação econômica das mulheres (98º)”, explicou o relatório. Os autores do documento — incluindo professores da Escola de Economia da Universidade de Harvard e da Escola de Negócios de Londres — destacaram os perfis das nações avaliadas.

Em entrevista ao Correio, Fiona Greig, do Centro para Desenvolvimento Internacional de Harvard, afirmou que o Brasil está abaixo da média em relação ao resto do mundo. “O país está apenas 65% no caminho para a igualdade sexual nas áreas de economia, política, educação e saúde. Como ficou na 67ª colocação, só obteve melhores resultados que 42% dos outros países analisados”, disse a co-autora do relatório. “O governo brasileiro poderia promulgar leis mais fortes em relação à discriminação salarial. Também sugiro o financiamento de programas para encorajar as mulheres a entrarem na política”, recomendou. O Brasil ocupa o 63º posto na categoria participação econômica e oportunidade para as mulheres; e o 1º em saúde.

DEMOCRACIA

A Suécia é o único país onde homens e mulheres formam números iguais de ministros e parlamentares. Na Finlândia, Islândia, Noruega e Dinamarca, elas ocupam um terço dos assentos do Parlamento e dos ministérios. Os nórdicos também foram os líderes na área da participação econômica. As mulheres são a maioria nos postos de trabalho técnicos e profissionais, e representam pelo menos um terço dos legisladores, autoridades do governo e gerentes em todos os cinco países da região.

“Pela primeira vez a sensação que muitos de nós temos é apoiada por estatísticas”, comemorou a advogada Cherie Booth, mulher do premiê britânico, Tony Blair. “De maneira nenhuma a distância entre homens e mulheres foi eliminada”, alertou, durante o lançamento do ranking. O relatório revela que a desigualdade no que diz respeito a saúde é muito pequena — a variação para os 115 países é de 0,9796 a 0,9227. As Filipinas foram a surpresa do estudo: conseguiram boas notas em todos os quesitos e aparecem na lista dos cinco a diminuírem a desigualdade na saúde e na educação. República Dominicana, França, Honduras e Lesoto são os outros países.

SOCIEDADE E POLÍTICA

Medidas e métodos nos esforços com vista à igualdade entre sexos
A Lei norueguesa para a Igualdade entre os Sexos foi adoptada em 1978. A Lei proíbe toda a discriminação com base no sexo e aplica-se a todas as áreas da sociedade. Estipula ainda que as autoridades, os funcionários estatais e os parceiros sociais são responsáveis pela promoção activa da igualdade entre sexos nas suas respectivas esferas de responsabilidade.

A Lei da Igualdade entre Géneros é aplicada pelo Provedor de Justiça para a Igualdade e a Anti-discriminação, um órgão estatal politica e profissionalmente independente. Provedor de Justiça para a Igualdade e a Anti-discriminação trata, sem custos associados, das queixas relativas a violações da Lei da Igualdade entre Géneros. O Provedor trabalha também a nível da promoção da igualdade entre os sexos e fiscaliza os desenvolvimentos sociais com o fim de identificar e chamar a atenção para as condições que impedem a igualdade entre os sexos e o tratamento igualitário.

O Ministério das Crianças e da Igualdade lança e apoia actividades de I&D que proporcionem um conhecimento básico satisfatório a políticas relacionadas com a igualdade entre os sexos e o tratamento igualitário de homossexuais e lésbicas. O ministério desempenha um papel de liderança, coordenação e cooperação nas relações colaborativas interministeriais de combate à mutilação genital feminina, ao casamento forçado, ao tráfico de mulheres e crianças e a situações de abuso no seio familiar. A Direcção Geral para a Infância, a Juventude e a Família da Noruega administra fundos estatais a centros de crise. O Ministério das Crianças e da Igualdade trabalha em proximidade com outros ministérios relevantes nos esforços para garantir salário igual por trabalho igual e para promover um melhor equilíbrio entre os géneros em processos e fóruns fulcrais de âmbito político e económico.

O Governo norueguês tem em elevada prioridade os contactos com ONGs/OSCs sobre questões ligadas à igualdade entre sexos. Essas organizações são convidadas com regularidade a dar as suas opiniões sobre assuntos públicos relativos à igualdade entre sexos, bem como a participar em delegações internacionais. Está também disponível financiamento básico estatal para estas organizações (da Direcção Geral para a Infância, Juventude e Família), bem como apoio a medidas definidas de igualdade entre sexos.

É importante a existência de uma perspectiva de género para enfatizar que, tanto as mulheres como os homens operam de acordo com escolhas e prioridades características do seu género. O ministério tomou medidas políticas activas para mobilizar os homens enquanto parceiros nos esforços para a igualdade entre os géneros e fornece apoio ao centro de recursos masculinos, REFORM.

A Noruega participa também nos esforços internacionais para a igualdade entre os géneros, em especial no seio do Conselho de Ministros Nórdico, na UE, na ONU e no Conselho da Europa. Como membro do Espaço Económico Europeu, a Noruega tem como obrigação cumprir todas as disposições da EU que regulam a discriminação com base no género. A Noruega incorporou a Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEFDM) na Lei da Igualdade entre os Géneros e apresenta a cada quatro anos um relatório sobre as tendências relativas à situação das mulheres na Noruega à ONU.

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ESTRATÉGIA DE INTEGRAÇÃO: PERSPECTIVE DE GÉNERO NA POLÍTICA ESTATAL E NA PROVISÃO DE SERVIÇOS

De acordo com a Lei para a Igualdade entre Sexos, a promoção a igualdade entre sexos em todas as áreas da sociedade é da responsabilidade geral. Foi introduzida uma estratégia de perspectiva do género para todas as actividades de âmbito público em 1986, sendo ainda activamente aplicada. É da responsabilidade da autoridade estatal relevante garantir que a igualdade entre sexos, por exemplo na vida laboral, na educação, no sistema de saúde, em termos de direitos sociais, de rendimento, etc. Em 2003, uma emenda à Lei para a Igualdade entre Sexos entrou em vigor, estipulando que as autoridades públicas e os empregadores deverão empreender esforços sistemáticos e objectivados para a promoção da igualdade entre sexos, devendo apresentar uma descrição anual das medidas implementadas para promover a igualdade entre sexos.

O princípio da perspectiva do género foi integrado na política orçamental do governo norueguês. O objectivo da elaboração orçamental com sensibilidade para as questões de igualdade entre sexos é promover a igualdade entre sexos e uma distribuição justa dos recursos públicos, bem como aumentar a eficácia e a qualidade da provisão de serviços. A Noruega está activamente envolvida na cooperação nórdica, europeia e internacional com vista a desenvolver e promover a perspectivação do género e a orçamentação igualitária entre sexos.

Texto da autoria do Ministério para as Crianças e a Igualdade
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AS MULHERES NA POLÍTICA NORUEGUESA

Na Noruega, as mulheres tiveram um grande sucesso na obtenção de influência política. Há trinta anos, apenas 15 por cento dos representantes no Storting (Parlamento norueguês) eram mulheres, ao passo que nos anos mais recentes esse número flutuou entre 36 e 39 por cento. O aumento da paridade entre as mulheres e os homens na tomada de decisões está estreitamente ligado às oportunidades de educação e emprego para as mulheres. No entanto, a competência, a experiência, as atitudes positivas quanto à igualdade dos géneros e a boa vontade não são suficientes por si mesmas. A experiência indica que a proporção de mulheres nas instituições políticas não aumentará a não ser que medidas direccionadas, tais como campanhas especiais e quotas para igualdade entre sexos, sejam utilizadas.

Um sistema de quotas para igualdade entre sexos foi adoptado pela primeira vez Pelo Partido Socialista de Esquerda e pelo Partido Liberal já na década de setenta do século XX. Actualmente, praticamente todos os principais partidos noruegueses aplicam um sistema de quotas para a igualdade entre sexos nas nomeações para as eleições, assim como para constituir os órgãos dirigentes dos partidos a todos os níveis. Este sistema de quotas é voluntário e auto-imposto. A Noruega não possui qualquer provisão legal para o equilíbrio entre os sexos nos partidos políticos ou em órgãos directamente eleitos.

Foi igualmente introduzido um sistema de quotas nas comissões, conselhos directivos e nos conselhos de nomeação estatal. Há trinta anos, as mulheres compunham somente 11% da representação de tais assembleias. Em 1981, disposições relativas a um necessário equilíbrio entre os sexos nas comissões de nomeação estatal, etc., foram introduzidas na Lei para a Igualdade entre os Géneros, e desde 1988 existe um requisito que define que o mínimo de representantes de cada género seja de 40 por cento. Após as emendas efectuadas mais recentemente, o nível de representação feminina melhorou em 22 por cento, alcançando uns estáveis 40 por cento em 1997.

Em 1986, a Primeira-Ministra Gro Harlem Brundtland nomeou um Governo com um número recorde de mulheres. Desde então, nenhum governo norueguês foi constituído com menos de 40 por cento de mulheres.

Representação igualitária entre sexos na direcção de empresasNúmeros de 2003 demonstravam que uma média de 8,5 por cento dos membros das direcções (representantes eleitos pelos accionistas e pelos empregados) em sociedades anónimas de responsabilidade limitada no sector privado norueguês era constituída por mulheres (dados de Julho de 2003), ao passo que nas empresas estatais o número era de 45,7 por cento (dados de Março de 2003).

A 1 de Janeiro de 2004, foram emendadas disposições legais empresariais em relação à representatividade nas direcções das empresas em todas as companhias estatais. Passou a ser obrigatório que as direcções das referidas empresas tivessem um mínimo de 40 por cento de representatividade de ambos os sexos.

Foram igualmente adoptadas emendas correspondentes nas sociedades anónimas de responsabilidade limitada do sector privado, embora tenha sido assinado um acordo com o sector empresarial que estipulava que as referidas normas não entrariam em vigor se o desejado equilíbrio entre os géneros fosse conseguido de forma voluntária ao longo do ano de 2005. De acordo com os números conseguidos pela Statistics Norway, existiam 519 sociedades anónimas de responsabilidade limitada na Noruega a 1 de Julho de 2005. De entre estas, 68 (13,1 por cento) satisfaziam as normas regais relativas à representação dos géneros. A média de representatividade das mulheres em lugares permanentes na Direcção das empresas (proprietário e funcionário eleito) nas sociedades anónimas de responsabilidade limitada norueguesas era de 15,5 por cento. Em vista desta situação, o Governo Stoltenberg decidiu implementar as regulamentações a partir de 1 de Janeiro de 2006.

Como comparação, números fornecidos pela Statistics Norway demonstram que cerca de 60 por cento de todos os estudantes no ensino superior são mulheres e que o número de mulheres que concluíram o ensino superior excede actualmente o número de homens.

A nova legislação não de aplica a sociedades por quotas. Na Noruega, essas empresas são, na sua maior parte, compostas por pequenas empresas familiares em que os proprietários são pessoas singulares que trabalham nas suas próprias direcções. A legislação sobre representação dos sexos adapta-se menos a este tipo de empresa. Numa S.A.R.L., por outro lado, a acionbilidade estará distribuída de forma mais ampla e a direcção da empresa caberá menos a pessoas singulares.

Texto da autoria do Ministério para as Crianças e a Igualdade