sábado, 27 de setembro de 2008

Mulheres nas Eleições Municipais III – Especial Centro-Oeste

Por Patrícia Rangel,
Cientista política e consultora do CFEMEA.

Há somente 17,2% de mulheres legisladoras no mundo e 19,5% nas Américas. Segundo a ONU, no atual ritmo, a igualdade de participação entre os gêneros em casas legislativas só será concretizada em cem anos. O Brasil, com 8,7% de deputadas, está em 146ª num ranking de 192 países analisados pela União Inter-Parlamentar (órgão vinculado à ONU) e em penúltimo na América do Sul.

O período eleitoral oferece-nos a cada instante provas de que, na democracia representativa brasileira, o poder político institucional ainda é masculino, branco, heterossexual, cristão, urbano. Nestas eleições, apesar de serem maioria do eleitorado (51,7%), as mulheres são minoria das candidaturas (21,2%). Nas últimas eleições municipais, o quadro não foi mais animador: elas eram 21,3% dos candidatos. Somente 7,5% dos prefeitos e 12,6% dos vereadores/as eleitos eram mulheres.

Dos 130.603.787 de eleitores brasileiros aptos a votar nas eleições municipais, 9.148.124 (7%) estão no Centro-Oeste. Apesar de ser a região com menor quantidade de votantes no país (Sudeste tem 43,5%, Nordeste tem 27%, Sul tem 14,9% e Norte, 7,2%), é uma das tem que mais mulheres votantes: elas são 18.424.915 ou 51,1% dos eleitores. O Centro-Oeste perde, em termos de eleitorado feminino, para o Sudeste (51,9% do eleitorado), o Nordeste (52%) e o Sul (51,4%), mas ganha do Norte (49.9%).

Apesar de maioria do eleitorado, as mulheres são minoria das candidaturas. Na média nacional, elas são 21,2% do total de candidatos a prefeito, vice-prefeito e vereador (10,3% das candidaturas a prefeito e 21,9% candidaturas ao cargo de vereador). O Centro-Oeste tem 21,3% de candidaturas femininas a todos os cargos, enquanto Norte Sudeste, Nordeste e Sul têm 21,8%, 21,1% 21,6% e 19,9%, respectivamente. No Centro-Oeste, as mulheres são 10,2% dos candidatos a prefeito e 22,1% dos candidatos a vereador.

Em Goiás, o 12º estado brasileiro em quantidade de eleitores, há 1.984.609 eleitoras (51.2% dos 3.873.536) contra 1.888.293 votantes homens. Somando candidatos a prefeito, vice-prefeito e vereador, as mulheres são 20,6% do total (3.232 em 15.672). Elas são 68 dos 658 candidatos a prefeito (10,3%) e 3.071 das 14.356 candidaturas a vereador (21,3%).

Em Mato Grosso, os homens ainda são maioria do eleitorado, contrariando a tendência nacional: 1.016.612 dos 1.993.130 eleitores, ou 51,1%, são homens. Ainda assim, o percentual de candidatas não está muito abaixo da média nacional: as mulheres são 20,8% das candidaturas a prefeito, vice-prefeito e vereador. Elas somam 35 dos 342 candidatos a prefeito (10,2%) e 1.714 dos 7.983 a vereador (21,4%).

Em Mato Grosso do Sul, há 1.617.740 votantes, dos quais 48,8% são homens e 51,1% são mulheres. Em relação às candidaturas femininas, elas são 24,5% do total: 21 dos 183 candidatos a prefeito (8,7%) e 1.233 dos 4.884 candidatos a vereador (25,2%).

A região não aderiu substancialmente à tendência nacional de candidaturas unicamente femininas à prefeitura: dos 16 estados que possuem municípios só com candidatas mulheres, 1 é do centro-oeste (Goiás, com uma cidade nessa situação). Além disso, 2 dos estados que não possuem candidatura feminina na disputa pela prefeitura da capital estão na região: Goiás e Mato Grosso.

Da efetividade e correta aplicação da lei de cotas no caso das assembléias municipais.

Como já vimos, para os cargos legislativos disputados nas eleições municipais de 2008 (vereador/a), as mulheres são somente 21,9% dos candidatos no Brasil e 22,1%, no Centro-Oeste. O que esses dados mostram é que as mulheres são sub-representadas, não só em cargos do Legislativo e do Executivo em todos os níveis, mas ainda no jogo eleitoral, na convocação e seleção de candidaturas.

No Brasil, a legislação eleitoral prevê cotas para mulheres nas candidaturas a cargos legislativos: a lei n. 9.504/97 reserva no mínimo 30% e no máximo 70% das vagas de candidaturas para cada sexo, em eleições proporcionais. A norma já é falha por natureza, pois designa às mulheres somente 30% das vagas nas listas eleitorais num país em que mais da metade da população é composta por mulheres (a lei fracasse em transferir para as assembléias legislativas a realidade da sociedade). Além disso, a legislação não estabelece sanções ou mecanismos que garantam o cumprimento da lei de cotas. Para piorar, a lei n. 9.504/97 permite ao partido “registrar candidatos para a Câmara dos Deputados, Câmara Legislativa, Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais, até cento e cinqüenta por cento do número de lugares a preencher”. Ou seja, a mesma lei que reserva cotas para mulheres providencia o mecanismo para neutralizar seus efeitos. Isso nos ajuda a entender porque somente 12,6% dos vereadores eleitos em 2004 e 11,6% dos eleitos em 2000 eram mulheres.

Sendo aproximadamente metade da população e 52% do eleitorado, não há lógica no fato de haver somente 21,9% de candidatas mulheres a vereador no país e 22,1% no Centro-Oeste. Se a lei de cotas é falha, insuficiente ou facilmente neutralizada e existe um grave problema de representação feminina na região e no país, é preciso modificá-la, substituí-la ou descartá-la. Mais que isso, é preciso modificar o sistema eleitoral e o sistema político brasileiro como um todo. Isso porque a baixa representação feminina não diz respeito somente às mulheres, diz respeito à democracia. A proporção de mulheres em cargos legislativos tem sido cada vez mais apontada como indicador da qualidade da representação política e critério para mensurar a democracia. Podemos falar em déficit democrático no Legislativo pois uma assembléia só é considerada representativa se sua composição for uma miniatura da sociedade. Uma vez que há aproximadamente 50% de cidadãs e quase nada de legisladoras, é porque não há representação de fato.

Daí a necessidade de se alterar, por meio de uma reforma política, as regras do jogo eleitoral, reservando 50% das vagas das candidaturas para mulheres, como meio de buscar a paridade, e estabelecendo a formação de listas fechadas apresentadas por partido ou coligação, a garantia da alternância por sexo, a destinação de 30% do tempo da propaganda eleitoral gratuita na televisão ou no rádio, entre outras medidas. A importância da participação igualitária e plena da mulher na política institucional precisa ser reconhecida e estimulada. Porque sem igualdade não há democracia.

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